Com origem etrusca e depois romana,
Siena chegou a disputar com Florença o lugar de destaque da região durante a
Idade Média e o Renascimento. Perdeu a disputa, é verdade, mas nem por isso
saiu derrotada. Quer uma prova? O centro histórico da cidade é considerado
patrimônio da humanidade pela Unesco (órgão das Nações Unidas para a Educação e
a Cultura).
O título não foi em vão. Siena é um
esplendor de arquitetura, cultura e história. No primeiro aspecto, possui
construções magníficas, como a catedral erguida no século 13 e toda decorada
com mármore preto, branco e vermelho e com mosaicos dos mais belos já vistos em
todo o mundo. No que diz respeito à cultura, a cidade sedia um dos eventos mais
relevantes da Itália, o famoso palio. Quanto à história, basta dizer que o
primeiro banco tal como o conhecemos hoje surgiu lá – e ainda está na ativa.
Andar por Siena é mergulhar
em um passado de glória. A cidade virou rota mercantil, o que a fez ganhar
destaque séculos atrás. Ficava num ponto estratégico, entre Roma e o norte do
país (na época ainda não unificado, o que só ocorreria no século 19). Reuniu
poderosos, que transitaram pelas mesmas vielas que hoje podem ser pisadas por
turistas de todo o mundo. São vias muitas vezes escuras e frias, em subidas e
descidas, repletas de símbolos que identificam as famílias e as contradas
(espécies de paróquias ou bairros) a que pertencem (a disputa entre elas é a
raiz do palio).
Poços, arcadas, relevos e desenhos marcam os imóveis.
Igrejas são muitas, como em
toda cidade italiana do período. Destaque mesmo é a catedral. Construída entre 1215
e 1263, parece imponente diante da escadaria e do pequeno monte no qual foi
erguida. Logo na entrada, turistas param para observar os mosaicos do chão.
Eles contam a história da cidade de modo ilustrativo (um deles simboliza o domínio que Siena exercia na região) e nas mesmas cores que
ambientam o templo, conferindo plena harmonia ao lugar.
Os pilares em mármore
branco e preto ajudam a dar à arquitetura do templo um tom singular e a realçar
o dourado reluzente em vários pontos. Definitivamente, a igreja é única.
Juntam-se
a isso os tradicionais afrescos, o teto ricamente decorado, com estrelas
douradas (o que indica um certo tom astrológico) e tem-se uma verdadeira obra
de arte. E olha que ela não chegou a ser concluída. Ao lado da catedral, onde
hoje funciona um museu, é possível ver a parede erguida para ser uma nave
lateral - que nunca chegou a existir.
É na Piazza del Campo, porém,
que estão as principais estruturas arquitetônicas de Siena. A praça por si só
já é um tesouro. Possui um formato de leque ou meia lua. Da frente da
prefeitura - o belo e imponente Palazzo Pubblico, uma construção de tijolos
vermelho-alaranjados com torres de castelo e dezenas de janelas abobadadas -, partem
nove divisões. Como a praça tem uma angulação acentuada, o desenho formando o
leque fica ainda mais evidente.
Não é um desenho qualquer. É
um forte símbolo da cultura e religiosidade locais: cada divisão dizia respeito
a uma contrada. Tão relevante quanto isso, segundo uma guia, é um recado que
Siena dava ao mundo na época: a união das contradas representava princípios republicanos
e de democracia numa época (século 12) em que ainda prevaleciam poderes feudais.
A cidade à frente do seu tempo.
Valores históricos,
culturais, religiosos e também artísticos. O chão da praça em pequenos tijolos
vermelhos é diferenciado e raro. Para completar, a famosa fonte Gaia, harmônica
e estrategicamente instalada no espaço central, na direção do imponente prédio
da prefeitura, ao lado do qual ergue-se a famosa torre Mangia. Uma fonte de água,
símbolo da vida, com nome místico – é como esotéricos
chamam o planeta Terra; na mitologia, gaia é a “Mãe Terra”.
E como uma cidade que se
apresentava à frente do seu tempo, pioneira em vários aspectos, político e
econômicos, sucumbiu? Talvez porque não tenha acumulado o poderio militar da
rival Florença ou então porque os recados que emanava ainda eram prematuros
para períodos marcados por senhores feudais e aristocratas – e as famílias
florentinas eram bons exemplos de poder.
O fato é que Siena perdeu a
batalha, mas coube à história fazer com que não perdesse a guerra. O tempo a
recolocou num lugar de valor e destaque na Toscana, ainda que esteja distante
do brilho de Florença. Hoje, porém, não há disputa entre elas. Ao contrário:
são, ambas, parte de um rico enredo que ajuda a contar muito da história da
Itália e – por que não? – da civilização ocidental atual, que ainda carrega
fortes marcas daqueles períodos.
Bem, ao menos os bancos ainda
estão por aí (e o pioneiro deles está lá, em Siena, para quem quiser ver...).
Nenhum comentário:
Postar um comentário