Foram dias nublados, cinzentos, que pouco combinam com o clima
carioca. Do pouco que pudemos aproveitar da praia, guardo uma foto em que
estamos – meu irmão, quatro anos mais velho, e eu enterrados na areia. Lembro
bem da praia de barranco, que nos assustou (estávamos acostumados às praias
planas do litoral santista).
A maior lembrança daqueles dias, porém, foi mesmo a
mamadeira. Sistemático (é do que minha mãe me acusa até hoje, mas esta é outra
história) desde pequeno, eu só saía da cama após tomar meu “mamá” – um
vitaminado na temperatura certa, “quente não tão quente”, como costumava pedir
(não, eu não sabia que a isto se dava o nome de morno...).
E qual, afinal, o problema com a mamadeira? Minha mãe não
tinha levado os apetrechos e frutas para fazer diariamente o tal vitaminado e
meu pai desceu até algum boteco pedir que preparassem um. Logo veio ele,
animado por ter conseguido o “mamá”. Até que fui tomar o dito cujo e simplesmente
não conseguia beber. Motivo: meu pai não havia especificado quais frutas podiam
ser batidas e colocaram abacate. E eu o-d-e-i-o abacate!
O “mamá” frustrado virou história de família, guardada no
baú da memória. Lembro de ver a mamadeira no criado do quarto do hotel,
estragando durante o passar das horas. Não lembro como meus pais contornaram a
celeuma que eu devo ter criado, mas o fato é que outra mamadeira não veio e eu
segui minha vida.
Dos pontos turísticos, nenhuma lembrança. Ou vagas
lembranças, imagens insuficientes para constituir algo descritível.
Voltei ao Rio em setembro de 1986, já com nove anos, numa
excursão do bairro. Desta vez só com minha mãe. A hospedagem melhorou: praia de
Copacabana, um hotel da rede Othon. Foi, de fato, minha estreia na Cidade
Maravilhosa. Com direito a suposto lanche com carne de gato no alto do Cristo
Redentor e passeio – cafona – ao aeroporto do Galeão, com direito a “jantar”.
Emocionante mesmo foi a visita ao Maracanã.
Três anos depois, em outubro de 1989, nova visita, dessa vez
relâmpago. Quase um bate-volta, com direito a banho improvisado no chuveiro de
banhistas de um edifício na orla da Barra da Tijuca. Tinha 12 anos e fui com
meu pai assistir a um jogo da Internacional contra o Botafogo no Maracanã pelo
Campeonato Brasileiro (bons tempos aqueles em que minha Inter enfrentava os
grandes do futebol, mas esta também é outra história...).
Foi nessa visita que vi na praia a atriz Fernanda Torres e o
ator Pedro Cardoso. Eles gravavam, num dia nublado, cenas de um especial para a
TV Globo chamado “Todas as mulheres do mundo”. Fã de televisão desde pequeno e
tiéte da atriz, que havia protagonizado a primeira novela a que assisti na
vida, a segunda versão de “Selva de Pedra”, lembro de ter corrido até uma
barraca em busca de papel e caneta. Lá fui pedir um autógrafo para ela (sim,
ignorei o ator porque não o conhecia na época...). Guardo até hoje aquele
pequeno pedaço de folha de caderno com a assinatura da “Fernandinha”. Bem como
guardo na memória a experiência de ter assistido a uma partida de futebol no
“Maraca” (o Botafogo venceu por 1 a 0, mas isto é irrelevante).
Em 1998, passei pelo Rio mais uma vez de forma relâmpago
quando visitei os estúdios da TV Globo no Jardim Botânico.
A partir de então, passei a sentir um certo repúdio pela
cidade. Provavelmente em razão do noticiário que mostrava um lugar cada vez
mais violento, com balas perdidas, arrastões, etc. O fato é que o Rio de
Janeiro se tornou, para mim, um destino indesejado. Comecei a invocar com o
jeito carioca de ser - sabe aquela malandragem deliciosa e inigualável? Enfim,
assumi o que há de mais preconceituoso entre os paulistas na eterna disputa com
os cariocas. Pura – e repugnante – ignorância, admito.
Até que em 2012, quase 15 anos depois da última visita, o
destino me levou de volta ao Rio em duas ocasiões. Fui simplesmente arrebatado pela
beleza e pelos encantos da cidade – não há definição melhor definitivamente! Mais
amadurecido, enxerguei a Cidade Maravilhosa com outros olhos, agora despidos de
preconceitos. Eu a recebi de alma e peito abertos. E este “novo” Rio de Janeiro
que descobri pode ser resumido nas palavras da escritora Martha Medeiros em seu
livro “Um lugar na janela”:
“Gosto de São Conrado e de ver as asas-deltas aterrissando
na areia. Adoro passear de carro pela avenida Niemeyer. Achei a paisagem do
aterro do Flamengo um assombro – aquele Pão de Açúcar saltando do mar é arrebatador.
O Jardim Botânico é um dos mais belos do mundo. (...) A chegada na Lagoa,
depois de se atravessar o túnel Rebouças, é o maior cartão de boas-vindas que
uma cidade pode oferecer aos forasteiros. Mas o bairro de Ipanema, para mim, é
a verdadeira cara do Rio (...).” (p. 112-3)
Às vezes é preciso percorrer o mundo para finalmente
descobrir que o paraíso está tão perto de nós. Com seus defeitos e suas
qualidades únicas. Sim, o Rio de Janeiro continua lindo. Cada vez mais lindo!
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