Descobri que o coração não
aceita acasos. Ou melhor, nada fica – ou entra – no coração por acaso. Pessoas
ou lugares, animais ou objetos. Assim descobri Frankfurt a.M. – ou am Main (há
outra Frankfurt, “am Oder”; Main e Oder são dois rios e as respectivas cidades
ficam às suas margens). A principal delas, a que as pessoas via de regra
conhecem ou sobre a qual já ouviram falar, é a Frankfurt à beira do rio Main. É
ela que está, não ao acaso, no coração da Alemanha.
A cidade não é capital, mas
abriga o centro financeiro do país e serve de porta de entrada nacional para
grande parte das pessoas que chegam do exterior. Apesar disso, costuma ser
vista com certo desdém. Eu a via assim, confesso. Pudera: Frankfurt (chamemo-na
simplesmente assim) não possui o charme da Bavária (onde fica Munique) nem o
peso da história recente de Berlim. Pelo menos não tem a propaganda de ambas.
Como, pois, não se encantar
logo nos primeiros passos pela Römerberg, a principal praça da cidade antiga
(Altstadt)? Além da Römer Haus que dá nome ao lugar e foi sede da prefeitura
por seis séculos, estão lá a Alte Nikolaikirche e as típicas casinhas
germânicas, como se tivessem saído de algum conto de fadas cujos personagens
são biscoitos de baunilha e balas de caramelo. Casinhas parecidas com confeitos
de bolo, feitas de marzipã e cobertas com chantilly e chocolate. Hoje, abrigam
lojinhas, bares e restaurantes.
E a inclinação da praça faz
do local ainda mais mágico. Você se sente no meio de um enorme palco, com
aquele cenário encantador ao redor. Vê dali a torre vermelho-alaranjada da Kaiserdom,
a catedral, logo atrás, dominante na Domplatz, completando com a Paulskirche
(ali ao lado na Paulsplatz) o trio de igrejas separadas não mais do que 200
metros uma da outra.
Cada detalhe ajuda a
completar a paisagem: a janela decorada com figuras, cenas e brasões de estilo
germânico, delicadamente iluminados por pequenas lâmpadas amarelas, deixando à
mostra o interior com lustres igualmente decorados; os letreiros com fontes em
estilo gótico pendurados em armações de ferro e madeira escuros, com detalhes
em dourado, em formatos suntuosos que remetem a séculos... Nada escapa aos
olhos tamanha a profusão de encantos a observar.
Sem contar que a alguns
passos – outros 200 metros pela Fahrtor - está o Main, tão importante para a
cidade que lhe serve de complemento ao nome. Rio de águas amarronzadas, que
passam sob pontes como a Iron Bridge e sua romântica estrutura de ferro
esverdeada, logo ali em frente, após a Mainkai, de onde se vê na margem oposta,
imponente, a Dreikönigskirche – que, aliás, segue o estilo das demais
igrejas da área, ora com paredes cor de creme misturadas a tijolos alaranjados, ora apenas com tijolos avermelhados, sempre com uma
torre única. São todas como irmãs, unidas, pontuando a paisagem.
E lá se vai o Main rasgando a
cidade, contornando prédios que dão a Frankfurt um ar de modernidade singular e
incomum em cidades alemãs. Um “skyline” americanizado, como que para mostrar ao mundo que ali está uma das tantas fênix alemãs renascidas de tantas e cruéis batalhas. Não uma Fénix qualquer; a imponente e poderosa Frankfurt – um retrato da Alemanha do século 21. Um país que sobreviveu ao terror do nazismo e dos ataques aliados, viu suas cidades serem destruídas, reconstruiu-se e reergueu-se talvez mais forte que antes, para liderar a Europa unindo tradição e modernidade, escancarando seu passado para ajudar a contar uma história que, quiçá, não se repetirá.
É para este país que Frankfurt pulsa, emana sua vitalidade financeira e sua energia, tal como faz o coração. Não é à toa, pois, que a cidade está bem ali no centro, um pouco à esquerda do peito alemão. Tal como o coração nos seres humanos, o coração que a cidade – e o país, por que não? – cada vez mais tenta conquistar. A olhar para o charme e o encanto de Frankfurt, a modernidade e a civilidade alemãs, não será uma tarefa tão difícil...
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